250 anos peregrinando na fé

Este sábado, 30 de setembro de 2017, não será um simples dia. É marco na celebração de acontecimento histórico: há exatos 250 anos, a Cúria da Diocese de Mariana concede a autorização para que o português Antônio da Silva Bracarena comece, oficialmente, o culto à Virgem Maria, sob o título de Nossa Senhora da Piedade, no alto da Serra que se chamava Sabarabuçu, hoje, Serra da Piedade. Após ouvir a história da aparição de Nossa Senhora a uma menina surda e muda naquele território sagrado, Bracarena se converteu e decidiu viver no alto da Serra, como eremita. Lá, esse português que trabalhou na construção da Igreja Nossa Senhora do Bom Sucesso, em Caeté, edificou a Ermida da Padroeira, coração-alma do conjunto arquitetônico e paisagístico do Santuário Nossa Senhora da Piedade, que recebe peregrinos desde o século 18.

Celebrar os dois séculos e meio do povo peregrinando ao Santuário da Padroeira de Minas é reconhecer que a fé transcende o tempo, escreve a história, entrelaça vidas. Assim, constrói herança rica e um patrimônio de magnífica relevância.  Por isso, valorizar este dia 30 de setembro de 2017 é oportunidade para fecundar novos caminhos, contemplando o passado: as muitas gerações que caminharam rumo ao ponto mais alto da Serra deixaram importantes legados a todos os mineiros, especialmente para os peregrinos que hoje buscam o Santuário Nossa Senhora da Piedade. Hoje temos também muitos desafios que requerem novas respostas e as responsabilidades cidadãs, que são de todos, na defesa e preservação desse território sagrado.

O Santuário Nossa Senhora da Piedade contribui para cultivar a fé, fonte da força capaz de iluminar a cidadania e conduzir a sociedade na direção de novos tempos.  Percebe-se, pois, que 30 de setembro é data magna em Minas Gerais. E a magnitude desta marca no tempo remete ao mais profundo sentido da fé, que se inscreve na dinâmica das peregrinações. Uma dinâmica com força educativa. Contribui, entre outros aspectos, para fortalecer na consciência de cada pessoa o entendimento de que tudo passa e o tempo é bem precioso.  Afasta, assim, o risco nefasto de querer se perpetuar no tempo pelas ilusórias mazelas dos apegos, do acúmulo mesquinho de bens.

Peregrinar é antídoto para não cair no domínio da ambição desmedida, que induz à corrupção e suas consequências avassaladoras: devasta vidas, arruína a sociedade e atrasa avanços. Bracarena, com a sua história de conversão, mostra que há razões maiores e mais profundas do que o exclusivo objetivo de ganhar dinheiro. Ele, que veio para o Brasil em busca de riquezas, tocado pela fé, tornou-se promotor da devoção a Nossa Senhora da Piedade, no alto da Serra. Em Bracarena e nos muitos fiéis que fazem parte destes 250 anos de história das peregrinações ao Santuário está a comprovação de insubstituível necessidade: ter razões transcendentes, buscar a dimensão divina que faz o ser humano alcançar a sua plenitude.

A fé que move montanhas fez do maciço de Sabarabuçu – para além de suas riquezas minerais, ecológicas e do seu relevante aquífero – patrimônio imaterial. E a devoção a Nossa Senhora da Piedade nesse território sagrado tem origem oficial no documento da Cúria de Mariana, do dia 30 de setembro de 1767. Um marco inaugural na história do Santuário que é coração-síntese de Minas Gerais, pois reúne dons da natureza e da fé que definem o Estado. A religiosidade está, pois, nas raízes da cultura mineira, nas tradições do povo. A vivência da fé cultiva valores que humanizam, sensibilizam e por isso mesmo podem reorientar rumos e vidas. A fé contribui para resgatar o necessário sentido humanístico que pode debelar cenários degradantes, substituindo-os por dinâmicas alicerçadas na solidariedade e no respeito.

Por tudo isso, 30 de setembro há de se tornar em Minas Gerais dia especial de lembrança e comemoração: marco relevante na história tricentenária do Estado. Uma data que tem força diferente em relação às celebrações da Inconfidência Mineira, mas guarda a mesma importância, pois também pode impulsionar a transformação de ideais, a partir de personagens diversos com importância em diferentes campos – política, arte, cultura e religiosidade. Entre essas ilustres pessoas, encanta pensar, por exemplo, que a força da fé, em Bracarena – o ermitão convertido – amalgamou-se com a arte admirável de Aleijadinho, referência do barroco mineiro. Dessa união, nasce a imagem veneranda da Virgem da Piedade e o retábulo da Ermida da Padroeira.

Jubileu da devoção a Nossa Senhora da Piedade, Padroeira do Estado de Minas Gerais, 30 de setembro, é convite para todos mineiros contemplarem sua maior preciosidade: o lugar que é conjunto histórico, cultural, paisagístico, ambiental e religioso, Santuário da Padroeira de Minas Gerais. Todos possam peregrinar ao Santuário, deixando que esse território sagrado inspire dinâmicas cidadãs e religiosidades. Eis um exercício importante para desbravar novos caminhos e adotar práticas audaciosas, coerentes com a importância de Minas Gerais, Estado Diamante. Que cada pessoa possa vivenciar este Jubileu – 250 anos de história do povo peregrinando na fé ao Santuário Nossa Senhora da Piedade.

Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Arcebispo metropolitano de Belo Horizonte

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

*

code