26/11/2021 2:59 pm | Atualizado em: 03/12/2021 7:09 am
A Igreja Católica na América Latina e no Caribe celebra a sua 1ª Assembleia Eclesial, de 21 a 28 de novembro, com representantes reunidos no México, ao redor do Santuário Nossa Senhora de Guadalupe, e muitos evangelizadores participando a partir de tecnologias digitais. Com predominância de cristãos leigos e leigas, esta Assembleia Eclesial tem no horizonte um acontecimento marcante vivido pela Igreja no continente há 14 anos: a 5ª Conferência dos Bispos Latino-Americanos e Caribenhos, realizada no Santuário Nacional Nossa Senhora Aparecida, em maio de 2007. As indicações da Conferência, reunidas no Documento de Aparecida, estão sendo retomadas pelo coração do Povo de Deus na América Latina e no Caribe, conforme pede o Papa Francisco, para inspirar nova reação missionária em toda a região. Por meio de reflexões, avaliações, questionamentos, a Assembleia Eclesial, guiada pelo Documento de Aparecida, busca intuições inspiradas pelo Espírito Santo, para que a Igreja seja capaz de oferecer novas respostas aos desafios atuais.
A Igreja procura avaliar o seu caminho pela articulação de todos os segmentos do Povo de Deus. Uma clara consolidação vivencial e celebrativa do Sínodo sobre a Sinodalidade na Igreja, já vivido pelos cristãos católicos em todo o planeta. O Sínodo é um passo novo em escala maior, inspirado no que se vivencia em muitas instâncias locais, qualificando ainda mais o que significa caminhar juntos no contexto eclesial. Ultrapassa, assim, o simples sentido de uma dinâmica que procura investir mais na comunhão, participação e missão. O objetivo é continuamente promover a renovação da Igreja e o fortalecimento da fé cristã, com incidências transformadoras na dimensão existencial do ser humano e, consequentemente, nos contextos político, econômico e social, que precisam se reconfigurar ao sabor do Evangelho.
A Igreja Católica reconhece o tamanho de seu desafio e, por isso mesmo, celebra a 1ª Assembleia Eclesial da América Latina e do Caribe a partir de uma dinâmica com potencial para gerar os efeitos esperados. Pode-se dizer que é uma dinâmica tríplice, com estes movimentos conjugados: escutar, ver e anunciar. Esse tríplice movimento na celebração da 1ª Assembleia Eclesial ultrapassa o evento para alcançar respostas missionárias necessárias à Igreja, que enfrenta muitos desafios – a perda de fiéis, a rigidez em tradicionalismos e, especialmente, a urgência de se promover mais sinergia entre a fé cristã e a vida cotidiana. Os princípios do Evangelho de Jesus Cristo precisam mudar dinâmicas perversas que ameaçam a vida no planeta e, particularmente, a sociedade latino-americana e caribenha.
O ponto de partida da 1ª Assembleia Eclesial – e do Sínodo sobre a Sinodalidade – será sempre a “escuta”. Esta é a tônica forte ensinada no basilar Livro do Deuteronômio: “Ouve, ó Israel”. Ao escutar Deus, o Povo testemunha a sua fidelidade, expressa na fraternidade universal. Escutar Deus tem força e propriedade para gerar redirecionamentos e inspirar respostas. Neste tempo em que se fala muito, e de tudo, com pouca disponibilidade para escutar, torna-se ainda mais difícil superar as crises humanitárias e institucionais.
A necessidade de aprender a escutar Deus é sublinhada por Jesus muitas vezes. Em diálogo com Pilatos, na narrativa bíblica em que Cristo é condenado à morte na Cruz, Jesus explica: aqueles que são da verdade ouvem a sua voz. E a competência para ouvir está vinculada à capacidade de ver. Oportuno lembrar a narrativa sobre o cego Bartimeu, mendigo da estrada de Jericó. Ele, ouvindo a multidão, despertou-se para o personagem maior que ali passava, e gritou pedindo: “Senhor, tem piedade de mim”. A escuta da multidão, que gerou o clamor de Bartimeu, tornou-se oportunidade para o diálogo com Deus. Jesus pergunta ao cego: “O que queres que eu lhe faça?”. A pronta resposta: “Que eu veja”. Curado da cegueira, Bartimeu segue e anuncia o Mestre.
A escuta da Palavra de Deus será sempre o ponto de partida e a consequente capacitação para deixar-se interpelar pelas palavras-clamores dos pobres e sofredores, do meio ambiente, da humanidade sofrida. Isto significa que escutar Deus inspira a capacidade de ver com compaixão. E todos que veem à luz da fé anunciam com inabalável convicção o que diz o Documento de Aparecida: “Conhecer a Jesus Cristo pela fé é a nossa alegria; segui-lo é uma graça, e transmitir este tesouro aos demais é uma tarefa”.
Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Arcebispo metropolitano de Belo Horizonte
Presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB)